Rui Boavida*, in Jornal de Notícias
O economista e prémio Nobel da Paz Muhammad Yunus alertou em entrevista exclusiva à agência Lusa que os próximos quinze dias são cruciais na resolução da crise financeira, que previu durar pelo menos até 2010.
"A tendência é que leve muito tempo: entre 18 e 36 meses. O tempo necessário para que o processo [da crise] volte atrás", disse à agência Lusa Muhammad Yunus, o criador do microcrédito que fundou o Banco Grameen e recebeu o Nobel da Paz em 2006 pelos esforços para retirar populações da pobreza extrema concedendo-lhes pequenos empréstimos.
O antigo professor de Economia afirmou que "as próximas duas semanas são críticas para verificar se os níveis de confiança voltam ao normal" sem os quais os bancos não voltam a conceder empréstimos para reanimar o sistema económico.
Yunus frisou também que o pior ainda não passou e que a instabilidade pode repetir-se em breve.
"Esta crise não será a última. Pode voltar a acontecer no futuro próximo. Nos próximos 10, 20 anos, e será pior se voltarmos às tendências que condenamos agora como o capitalismo de casino, como o jogo nas bolsas de valores ou como a especulação a tornar-se jogo em vez de negócio".
Se a crise atingir a economia real vai destruir anos de esforços para reduzir a pobreza em todo o mundo, alertou também Yunus, autor do livro "O Banqueiro dos Pobres".
"Os que estavam a tentar fugir da pobreza são empurrados de volta e não conseguem fugir. Aqueles que acabaram de sair da pobreza são sugados de volta", disse.
"Se um milionário perde meio milhão tem outro meio milhão. Sente-se mal, mas tem ainda muito dinheiro de sobra. Se um pobre perde o emprego perde tudo, até a roupa que traz no corpo. Perde a ração diária de comida. Os pobres perdem tudo", sublinhou.
Em 1976, ao perceber que os bancos recusavam emprestar aos mais pobres, que não ofereciam garantias, Yunus criou o Banco Grameen, que empresta pequenas quantias sem exigir garantias, papéis ou identificação.
O banco tem agora 6,6 milhões de clientes - quase todos a criar pequenos negócios próprios para fugir da pobreza - e orgulha-se de ter uma taxa de recuperação de 98,85 por cento.
Com uma crise que começou no sistema de crédito norte-americano e se espalha agora a todo o sistema monetário internacional, Muhammad Yunus apela a uma solução internacional rápida e concertada.
"É preciso mais esforços do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional, dos governos dos diferentes países", afirmou.
"Sempre que há perturbações económicas, são os mais pobres que sofrem mais, não importa onde estejam, seja em países ricos ou pobres", conclui o Nobel da Paz.
* Agência Lusa