Sérgio Aníbal e Cristina Ferreira, in Jornal Público
O crédito malparado das empresas junto da banca poderá quase triplicar como consequência da crise financeira e do abrandamento económico, afectando o equilíbrio do sistema financeiro nacional, avisa o FMI na sua última análise à economia portuguesa.
No relatório ontem publicado, o FMI diz que a análise que fizeram à contas das empresas "sugere que a redução dos lucros e a subida das taxas de juro podem quase triplicar o valor actual do crédito malparado empresarial".
O impacto de um cenário deste tipo para o sector bancário é preocupante, mas, diz o Fundo, ainda controlável. "Os lucros dos bancos, as suas provisões e os níveis de capital existentes devem garantir uma almofada suficiente para absorver este choque, mas alguns bancos podem vir a precisar de reforçar as suas posições de capital", diz o relatório.
Esta é aliás a imagem global do FMI sobre o sistema financeiro português: o sector está saudável, mas as vulnerabilidades estão a aumentar. Entre elas, é destacada a dependência do financiamento nos mercados internacionais, o que, segundo o Fundo, "aumenta os riscos de liquidez".
O relatório assinala ainda que "as autoridades portuguesas estão cientes das vulnerabilidades e têm sido pró-activas a enfrentá-las". Afirma em particular que "os bancos com rácios de capital débeis foram fortemente encorajados a aumentar capital" e que, para resolver os problemas de liquidez, foi recomendado aos bancos que aumentassem o número de activos que podem usar como colateral para acederem aos empréstimos do banco central. Além disso, garante o FMI, "o Banco de Portugal aumentou o nível de monitorização das posições e dos planos dos bancos para enfrentarem potenciais faltas de liquidez".
A partir do momento em que rebentou a crise, o Banco de Portugal (BdP) reforçou os contactos com os bancos nacionais, de modo a monitorizar dia a dia os seus balanços. Desde aí o diálogo tem sido permanente, com os presidentes dos cinco principais grupos a operar em Portugal (CGD, BCP, BES, BPI e Santander) a serem chamados com frequência à sede do BdP. Nestes encontros o governador Vítor Constâncio envia mensagens e dá a sua leitura dos acontecimentos internacionais, além de solicitar esclarecimentos sobre a situação de cada um dos bancos. Uma iniciativa que tem sido acompanhada de um fluxo de informação permanente.
As novas regras do mercado (Basileia II) são mais exigentes em termos de rácios de capital, o que impõe aos bancos maior rigor nos balanços. Estes, por sua vez, recorrem a aumentos de capital, venda de activos e melhoria da gestão no controlo dos custos e dos riscos. No último ano, cinco bancos portugueses (CGD, BCP, BPI, Banif e BPN) foram forçados a avançar com aumentos de capital que no conjunto totalizaram 2,6 mil milhões de euros.
Foi o BES que em 2006 iniciou a era dos aumentos de capital no sector bancário português, com um incremento de 1,4 mil milhões de euros. Fonte oficial do BES disse ao PÚBLICO que não tem "intenção de aumentar o capital social do banco até final do ano". Actualmente o BES tem em curso um plano de reforço do seu capital que envolve, entre outras decisões, a venda de participações (Bradesco, EDP e PT). O BCP já manifestou intenção de largar algumas participações, enquanto o BPI encaixou 360 milhões de euros com a venda de 49 por cento do BFA, e a CGD anunciou esta semana a venda por 390 milhões de euros de acções da REN e da AdP. O banco holandês ING, num relatório sobre o sector financeiro, também chamava a atenção esta semana para a eventualidade de os bancos portugueses poderem ter reforçar o seu capital este ano, mencionando o BCP. Fonte oficial do BCP lembrou que fez já este ano um aumento de capital e duas emissões de dívida, encontrando-se "numa situação de capital confortável". Já o BPI lembra que "não está previsto nem há necessidade" de voltar a reforçar o capital nos próximos tempos.