Sérgio Aníbal, in Jornal Público
Exportações e investimento, afectados pela crise internacional, travaram economia em 2008
A produtividade do trabalho no sector privado em Portugal deverá registar este ano o crescimento mais fraco desde, pelo menos, 1990, o último ano para o qual foi possível recolher dados. Este é um dos desenvolvimentos mais preocupantes assinalados ontem pelo Banco de Portugal no seu boletim económico de Outono.
A produtividade deverá, segundo as contas da entidade liderada por Vítor Constâncio, crescer apenas 0,1 por cento em 2008, um valor que compara com os 1,8 por cento do ano passado e que supera a variação de 0,2 por cento em 2003, ano de variação negativa do PIB.
A explicação para este tão fraco desempenho está, segundo o Banco de Portugal, na "evolução da taxa de utilização da capacidade produtiva, que interrompeu no primeiro semestre de 2008 uma fase de crescimento acentuado iniciada no segundo semestre de 2006". Isto significa, na prática, que, a partir da primeira metade deste ano, ao crescimento do número de pessoas empregadas não correspondeu um aumento idêntico do trabalho por realizar, o que acontece porque, em simultâneo, as exportações e o investimento abrandaram de forma muito significativa.
A situação é preocupante porque, se não se voltar a verificar um aumento da procura interna e externa, a solução no sector privado para este crescimento fraco da produtividade poderá vir a passar, no curto prazo, por aumentos salariais baixos e por uma subida do desemprego.
Exportações em queda
No seu boletim trimestral, o Banco de Portugal apresenta uma estimativa de crescimento este ano para a economia portuguesa de 0,5 por cento, um valor que fica abaixo dos 0,8 por cento previstos pelo Governo e que constitui uma revisão em baixa da projecção de 1,2 por cento que o banco tinha feito no Verão. No relatório uma das explicações dadas para este valor - novamente abaixo da média europeia - é a "persistência de fragilidades que condicionam a evolução da produtividade". No entanto, a crise internacional explica uma parte significativa do abrandamento da economia.
Em especial, as exportações e o investimento são fortemente afectados. As vendas de mercadorias e de serviços ao estrangeiro abrandam de forma muito marcada. A estimativa do Banco de Portugal aponta um crescimento de 1,4 por cento, um valor que, a concretizar-se, será o mais baixo desde a crise de 1993. Em 2007, a variação deste indicador tinha sido de 7,6 por cento.
O problema está na queda da procura externa dirigida à economia portuguesa, que passou de um crescimento de 5,9 para 2,6 por cento. No entanto, o Banco de Portugal assinala a existência de "alguma queda de quota de mercado em 2008".
No investimento, o cenário é também sombrio. Depois de uma interrupção em 2007, este indicador volta a uma trajectória descendente. Em 2008, diz o banco, deverá cair 0,8 por cento. Todas as componentes do investimento abrandam, mas é na construção que se deverá verificar uma travagem acentuada, de quatro por cento.
Problema do endividamento
Como estava previsto, o Banco de Portugal não apresentou neste boletim previsões para o próximo ano. No entanto, as indicações que dá sinalizam uma ainda maior deterioração do ritmo de actividade económica. "Tanto o abrandamento da procura externa como as incertezas decorrentes da crise financeira deverão perdurar no futuro próximo", diz o banco. A principal ameaça é que a tendência de crescimento do consumo privado - um dos indicadores que não abrandaram - "não seja sustentável no futuro". Tudo devido ao endividamento, cujo custo para as famílias se irá cada vez mais sentir, "dado o nível relativamente reduzido da taxa de poupança e a parcela significativa do rendimento disponível que as famílias afectam às amortizações de capital e ao pagamento de juros".